Casa do Douro motivou reunião da CIMDOURO com os deputados da região

A CIMDOURO solicitou uma reunião com os deputados da região duriense que teve lugar no dia 7 de junho no museu do Douro, na Régua.
O motivo que esteve na origem desta reunião prendeu-se com a aprovação de uma resolução em conselho de ministros com vista a resolver o problema da dívida da casa do Douro, retirando-lhe o estatuto de associação pública de inscrição obrigatória dos viticultores.
O PS que tem vindo a manifestar a sua oposição a esta via, viu também muitos dos seus pontos de vista subscritos na proposta apresentada pela CIMDOURO.
Pelo PS estiveram presentes nesta reunião os deputados Agostinho Santa (Vila Real) e Acácio Pinto (Viseu).
Eis o teor da proposta aprovada na reunião extraordinária do conselho intermunicipal da CIMDOURO:

REFORMA DO MODELO INSTITUCIONAL DO DOURO
(Proposta de trabalho aprovada pela CIMDOURO)
«Enquadramento
Foi recentemente aprovada em Conselho de Ministros uma resolução que autoriza o Governo apresentar uma proposta de lei que resolva o problema da dívida da Casa do Douro, bem como criar condições para a sua transição para uma associação de direito privado, retirando-lhe o estatuto de associação pública de inscrição obrigatória dos viticultores.
Esta proposta, sob o pretexto de resolver um problema de carácter financeiro, cuja origem é por demais conhecida, e que resultou fundamentalmente do exercício de competências delegadas pelo Estado, vem, de forma clara, encerrar um percurso da reforma do tecido institucional da vitivinicultura duriense iniciado em 1995 com a publicação do Decreto-Lei 74/95, de 19 de Abril, que criou a CIRDD – Comissão Interprofissional da Região Demarcada do Douro.
Esse percurso foi fértil em vicissitudes e contratempos que demonstram bem a falta de ponderação dos ideólogos desta reforma e o total desconhecimento das especificidades da Região do Douro por parte daqueles que a implementaram.
É exemplo patente desta realidade a precoce (2003) extinção da CIRDD, cujas bases de funcionamento nunca respeitaram os princípios decididos, por unanimidade, pela sua Comissão Instaladora composta pelo IVP, Casa do Douro e AEVP o que demonstra, à saciedade, a leviandade e inoportunidade da decisão governamental, já nessa altura imposta, da alteração institucional da Região, nos termos em que foi decretada.
Esta nova reforma, sob o pretexto de criar novas estruturas que assegurem a representação paritária das profissões conduzirá na realidade, em conjunto com o progressivo esvaziamento de atribuições públicas da Casa do Douro impostas pelas anteriores, a um ainda mais acentuado desequilíbrio entre a representação do Comércio e da Produção cujas consequências são já patentes na atual situação económica e social da Região do Douro.
Desenvolvimento
A proposta de lei aprovada, se bem que diferente nas medidas que preconiza, segue a linha de rumo de outras anteriores que sempre condicionaram a resolução do problema financeiro da Casa do Douro à aceitação por parte desta de condições leoninas, que colocavam em causa a sua própria razão de existir enquanto representante de todos os viticultores durienses.
A reforma institucional que o Estado através dos sucessivos Governos pretendeu levar a cabo na Região mais não fez do que promover o enfraquecimento do organismo representativo da Lavoura, sob o pretexto da implementação de um verdadeiro modelo interprofissional, modelo esse que existia já no âmbito do Conselho Geral do então Instituto do Vinho do Porto, onde tinham representação paritária o Comércio e a Lavoura.
Nesse órgão a representação da Lavoura era assegurada pela Casa do Douro, enquanto associação que representava, de facto, todos os lavradores, sendo essa a realidade que conferia às suas tomadas de posição uma força e coesão necessárias à defesa dos interesses que representava.
Tal não poderia obstar que, face às novas realidades que se verificaram na Região, nomeadamente pela criação de novos agentes económicos como os produtores engarrafadores, a representação da Lavoura não merecesse ajustes, feitos de forma razoável, e que não colocassem em causa um modelo que sempre defendeu os interesses dos produtores.
Impõe-nos o rigor que não isolemos esta pretensa reforma institucional das consequências que a mesma impôs à Região do Douro, em especial desde o início do século XXI. Objetivamente, o modelo institucional agora desenhado corresponde a um retorno aos anos 20 do século passado, altura das graves crises durienses que conduziram à criação da Casa do Douro e do Instituto do Vinho do Porto.
E importa ainda não esquecer que, só no actual século, a Região, isto é os viticultores, terão visto os seus rendimentos reduzidos em mais de 50% (totalizando as perdas mais de mil milhões de euros), sendo que uma parte substancial dos vinhos produzidos na Região é vendida a valores muito abaixo do seu custo de produção.
A justificação agora utilizada, no articulado da resolução aprovada pelo Governo para a alteração do estatuto da Casa do Douro seria irónica não se desse o caso de ser trágica, ao referir pretender criar as condições para uma boa representação dos viticultores.
Trata-se do mesmo Estado que, tendo legislado sempre em sentido contrário àquilo que as circunstâncias exigiam, vem agora dizer que extinguindo o único organismo que poderia defender os viticultores irá assegurar a sua boa representação.
Em todo este processo que se arrasta desde 1995, sempre a Casa do Douro vem sendo impedida de encontrar um caminho para a sua recuperação com o pretexto da sua dívida.
Urge neste momento que se tenha a coragem de separar claramente as águas e resolver o problema da dívida que é, de facto, um entrave à prossecução dos fins a que a Casa do Douro está obrigada, sem que tal condicione ou imponha a implementação de alterações ao tecido institucional num sentido que a Região claramente não deseja.
E a resolução deste problema tem forçosamente de ser encontrada de forma autónoma, através de mecanismos de natureza financeira que permitam a rentabilização dos stocks e a sua introdução no mercado de forma gradual.
Pretender tratar simultaneamente este assunto com a reorganização institucional do Douro mais não pode ser entendido senão como uma chantagem à Lavoura Duriense, em especial quando associada à criação de condições para que forças ou corpos estranhos à região venham ilegitimamente usufruir de algo que gerações de viticultores durienses construíram.
Não será demais reforçar as imprevisíveis consequências para a Região da colocação no mercado dos vinhos afetos à dívida da Casa do Douro, desde logo nos volumes de mosto a beneficiar em cada colheita, caso a mesma seja efetuada apenas no propósito da rápida extinção daquela dívida.
Tais consequências serão ainda agravadas com as perdas financeiras, pela inevitável baixa de valor dos stocks, caso os vinhos sejam transacionados obedecendo apenas a critérios de natureza imediata, sem atender à sua especificidade.
Associado a este processo de venda dos stocks, e em complemento do mesmo, seria desejável o estabelecimento de um modelo de contratualização plurianual entre a Produção e o Comércio que permitisse a estabilização dos volumes a produzir anualmente bem como dos preços a praticar em cada vindima.
Tal modelo seria altamente vantajoso, quer para a Lavoura quer para o Comércio, pois daria sustentação à implementação de estratégias comerciais e de promoção de longo prazo, que orientassem a procura para os vinhos de Categorias Especiais, geradores de maior valor acrescentado, nos quais se incluem aqueles que pertenciam à Casa do Douro
E torna-se também necessário que a Casa do Douro, aliviada do peso de uma dívida que quer pagar, vendo admitidas também pelo Estado as razões da sua origem, possa ser reconhecida na sua ação como, mais do que o representante dos viticultores, um apoio efetivo e moderno à atividade dos mesmos e aos desafios que a produção vitivinícola enfrenta no século XXI.
Conclusão
A resolução agora aprovada enferma de vários vícios que, cada um de per si, seriam suficientes para a considerar desajustada e profundamente lesiva dos interesses dos produtores, mas que no seu conjunto constituirão a etapa final no caminho de desregulação do sector vitivinícola que tem vindo a ser seguido na Região do Douro, comprometendo irremediavelmente a sua sustentabilidade socioeconómica, com consequências imprevisíveis para o estatuto de Património Cultural da Humanidade que nos distingue desde 2001.
Esta Região não pode ver ainda mais fragmentada a representação institucional da Lavoura, sob pena de um ainda maior agravamento da sua situação socioeconómica, assunto que foi já profusamente abordado em outros documentos já produzidos pela CIM Douro, infelizmente sem qualquer resposta das entidades competentes, nomeadamente na utilização dos excedentes vínicos da Região para produção de aguardentes e sua utilização exclusiva na beneficiação do Vinho do Porto.
Não é legítimo, a coberto da resolução da dívida, condenar à morte uma Instituição que durante mais de 80 anos foi o baluarte dos produtores do Douro, assegurou a representação do Estado na Região e exerceu com elevado sentido de responsabilidade as atribuições que este lhe delegou.
Menos legítimo ainda será que tal aconteça tendo em vista a entrada na Região de outras forças que aqui nunca se conseguiram implantar e pretenderão usufruir do património que ao longo de gerações esta construiu, importa relembrar sem que o Estado para tal tenha contribuído com um cêntimo.
A Casa do Douro necessita de ver garantidas as condições para que possa rentabilizar o seu património, desenvolvendo uma estratégia transversal de valorização dos seus ativos pela sua afetação a atividades, desde logo na área da viticultura e enologia, através do apoio técnico, elaboração de projetos e proteção integrada, mas também no turismo, na formação de ativos, na valorização territorial do património, no desenvolvimento económico e podendo ainda complementar os serviços oficiais do Ministério da Agricultura e do Mar, cada vez mais concentrados e com escassez de recursos.
Dentre os ativos acima referidos importa distinguir os vinhos que, para além de garantia dos valores em dívida, têm, pelo seu carácter único e irrepetível um valor histórico para a Região e para o País que importa preservar de par com o que já foi feito com a classificação da Região como Património Cultural da Humanidade, não sendo aceitável que tal classificação não englobe também, ainda que informalmente, tão valioso acervo de vinhos dos quais alguns remontam aos primeiros anos do século XIX.
Proposta
Deverão ser criadas, ao longo de um período transitório e aliviada dos constrangimentos financeiros que a vêm estrangulando, as condições para que a Casa do Douro possa retomar a sua atividade, devidamente enquadrada no tecido institucional da Região e com a devida representação assegurada, tal como até aqui, no Conselho Interprofissional do IVDP.
i) A Casa do Douro deverá ver reconhecido o seu estatuto de associação de direito público e de inscrição obrigatória dos viticultores da Região Demarcada do Douro, porquanto só este poderá assegurar uma representação coesa da Lavoura nos órgãos institucionais da vitivinicultura duriense, ao contrário de uma pulverização dessa representação que só contribuiria para a maior degradação da situação socioeconómica do Douro;
ii) Deverá ser dada continuidade ao estudo apresentado pela CIMDOURO sobre a sustentabilidade económica da Região Demarcada do Douro que remunere justamente os excedentes de vinho hoje vendidos abaixo do custo de produção, nomeadamente pela utilização exclusiva no fabrico de Vinho do Porto de aguardentes vínicas provenientes da destilação de vinhos produzidos na Região;
iii) A Casa do Douro deverá ver reconhecida a titularidade do ficheiro cadastral da Região, que deverá manter e atualizar, com recurso às boas práticas que conduziram à criação do mesmo, complementadas pelos meios técnicos hoje disponíveis, nomeadamente os Sistemas de informação Geográfica e cartografia digital, mediante condições financeiras e de execução a protocolar com o IVDP;
iv) Deverá ser estabelecido entre o Governo e a Casa do Douro um acordo de dação em pagamento, para a regularização da dívida mediante a venda dos vinhos que constituem garantia dos créditos e avales concedidos, deverá ser efetuada de forma ponderada, num período de tempo tão dilatado quanto possível, de modo a não causar perturbações indesejáveis nos volumes de mosto a beneficiar anualmente e atendendo às estritas necessidades do mercado. Só assim se poderá assegurar a estabilidade da produção na Região e, simultaneamente, a adequada remuneração dos vinhos que a ser vendidos bem como dos stocks remanescentes;
Os valores de venda deverão ter como base uma avaliação rigorosa e fundamentada, efectuada por entidade independente segundo critérios que permitam valorizar as características destes vinhos, em detrimento do valor decorrente do potencial impacto que a sua colocação no mercado em volumes exagerados poderia causar;
Os vinhos deverão ser confiados a uma entidade independente designada pelo Estado e ficarão armazenados à guarda da Casa do Douro, mediante remuneração adequada, devendo esta sob fiscalização e controlo do IVDP, promover as operações técnicas necessárias à sua boa conservação e posterior colocação no mercado;
v) Ainda sobre o ponto anterior, mereceria algum aprofundamento a possibilidade de constituição de um fundo de investimento ou de uma empresa em modalidade de capital de risco que pudesse fazer a gestão dos stocks e a sua introdução no mercado, de forma racional e coordenada com a situação da Região em cada momento, assegurando em retorno a adequada remuneração de capital;
vi) Considera-se ainda fundamental a salvaguarda de um stock de vinhos históricos, com dimensão razoável e representativa, que deveria constituir Património da Região pelo seu carácter único e irrepetível que se afigura necessário preservar;
vii) Deverá ser encontrada uma solução para a regularização dos salários em dívida dos trabalhadores do quadro privado da Casa do Douro, devendo ver assegurados os seus direitos consagrados nas leis laborais, sendo afetados às atribuições que a instituição vier a desempenhar.
Aos trabalhadores em funções públicas deverá ser concedida a possibilidade de integração noutros serviços do Estado ou, em alternativa, ser facultada a possibilidade celebração de contrato individual de trabalho com a Casa do Douro, com a correspondente cessação do contrato de trabalho em funções públicas.»